‘Com Cachoeira livre, negócios ilícitos vão ser potencializados', diz procurador


Procurador que comandou investigação diz que esquema sofreu um baque,‘mas não está morto’; ele questiona o motivo de a CPI não avançar na apuração sobre os beneficiários dos recursos movimentados


Fernando Gallo, enviado especial
GOIÂNIA - Coordenador do núcleo de combate à corrupção do Ministério Público Federal em Goiás, instituição que desencadeou a Operação Monte Carlo, da Polícia Federal, e investigou as relações de Carlinhos Cachoeira com o jogo ilegal no Estado, o procurador da República Hélio Telho afirma que a tática de defesa de Carlinhos Cachoeira é a mesma utilizada pelos advogados do processo do mensalão, em julgamento desde agosto no Supremo Tribunal Federal. Na última sexta-feira, em sua primeira declaração pública desde que deixou a cadeia, após passar 226 dias preso em decorrência das investigações da operação, o contraventor Carlos Cachoeira afirmou que a Procuradoria tenta fazer “estrelismo” em cima dele e que as escutas telefônicas do processo são ilegais.
Hélio Telho, sobre a estratégia de Cachoeira: ‘Ele nunca se defende daquilo pelo que é acusado’ - Zuhai Mohamad/O Popular - 31/08/2012
Zuhai Mohamad/O Popular - 31/08/2012
Hélio Telho, sobre a estratégia de Cachoeira: ‘Ele nunca se defende daquilo pelo que é acusado’
“Você não vê ele se defender daquilo pelo que está sendo acusado. Em momento nenhum ele nega que tenha chefiado o esquema (de jogos ilegais) ou que o esquema exista. Ele diz que o processo é nulo. É a mesma tática de defesa que foi utilizada pelos advogados do processo do mensalão, que é tentar desqualificar o trabalho do Ministério Público”, sustenta Telho.
O procurador diz, nesta entrevista aoEstado, não ter dúvidas de que o esquema ilegal do contraventor “não está morto” e de que “os negócios ilícitos serão potencializados” com ele solto pela Justiça. Telho afirma que o indiciamento de dezenas de pessoas pela CPI do Cachoeira - que poderá ocorrer no relatório do deputado federal Odair Cunha (PT-MG), cujo resumo deve ser apresentado na Câmara nesta quarta-feira - “tem efeito jurídico zero” e critica duramente a comissão, ao dizer que ela tenta proteger os beneficiários dos recursos das empresas fantasmas do esquema. “Isso é realmente preocupante e deve ser analisado. Quem está sendo deixado de fora? Quem a CPI está protegendo?”, indaga o procurador da República.
Como o sr. avalia a soltura de Carlinhos Cachoeira?
Ele não foi solto pela Justiça Federal por falta de motivos para que seja mantido preso. Os motivos para que ele continue respondendo ao processo preso continuam intactos. O TRF e o STJ entenderam dessa maneira. Ele foi solto pela juíza de Brasília porque a pena que ele pegou lá é em um regime muito mais benéfico do que a prisão fechada em que estava provisoriamente. Na Justiça Federal ele foi solto porque, segundo o entendimento do desembargador Tourinho Neto, teria havido excesso de prazo, que aliás foi o próprio desembargador que provocou ao suspender a fundamentação penal a pedido da própria defesa. Há motivos para ele permanecer preso. As evidências estão mostrando que a quadrilha que ele chefia não se desarticulou e agora, com ele voltando a assumir novamente as atividades, os negócios ilícitos serão potencializados.
A condenação dele ao regime semiaberto no processo da Operação Saint-Michel foi branda?
A lei prevê que as penas entre quatro e oito anos sejam cumpridas em regime inicialmente semiaberto. A regra geral é essa.
É mais difícil levá-lo de volta à prisão do que teria sido mantê-lo preso?
Manter preso, na prática, e mais fácil do que mandar de volta para a cadeia. Mas normalmente é mais difícil mandar de volta para a cadeia quando a Justiça entende que não há mais motivos para manter preso. No caso específico de que estamos cuidando, a Justiça não entendeu que os motivos não existem, e sim que eles subexistem. Ela só soltou porque houve demora no julgamento e porque não poderia mantê-lo preso aguardando o julgamento por tanto tempo assim.
O sr. conhece de longa data a atuação de Cachoeira. Acredita que ele possa rearticular um esquema grande, muito além de reorganizar o jogo em Goiás?
Pelas centenas de milhões de reais que esse esquema movimentou, não tenho dúvida nenhuma de que esse esquema não está morto. Ele pode ter sofrido um revés, um baque, mas ele não morreu e a tendência é ele se regenerar se o combate não se aprofundar.
Em sua primeira entrevista depois da saída da prisão, Cachoeira disse que as teses da Procuradoria são “maliciosas” e que os grampos da Operação Monte Carlo são completamente ilegais. O que o sr. acha disso?
Você não vê ele se defender daquilo de que está sendo acusado. Em momento nenhum ele nega que tenha chefiado o esquema ou que o esquema exista. Ele diz que o processo é nulo. É a mesma tática de defesa que foi utilizada pelos advogados do processo do mensalão, que é tentar desqualificar o trabalho do Ministério Público, a validade das provas que foram produzidas e dizer que no fim das contas não acontecerá o resultado que se tenta produzir.Qual a avaliação que o sr. faz da proposta de indiciamento de dezenas de pessoas pela CPI do Cachoeira, inclusive do governador Marconi Perillo?
O indiciamento em si é um nada jurídico, não produz nenhum efeito jurídico contra a pessoa que está sendo indiciada. Ele resulta mais em estrépito, em argumentos que os adversários utilizam no palanque eleitoral do que propriamente em resultado prático. O indiciamento pela CPI não vai punir ninguém, não vai abrir processo contra ninguém. O efeito jurídico prático é zero. Então não me preocupa que dezenas de pessoas estejam sendo indiciadas. O que me preocupa mais é quem não está sendo indiciado.

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