Caixa e governo admitem erro ao tratar dos boatos sobre Bolsa Família

Presidente do banco e ministro da Justiça afirmam que sabiam desde o início sobre antecipação de pagamentos a beneficiários de programa


Anne Warth e Ricardo Della Coletta - O Estado de S. Paulo
BRASÍLIA - O governo federal disse nesta segunda-feira, 27, que errou ao tratar publicamente dos boatos sobre o fim do Bolsa Família que levaram centenas de pessoas a caixas eletrônicos dez dias atrás. Integrantes da gestão Dilma Rousseff admitiram que seguraram por pelo menos quatro dias a informação segundo a qual os recursos do programa social foram liberados para saque na véspera da corrida aos bancos iniciada no dia 18.
Jorge Hereda deu entrevistas nesta segunda sobre os tropeços no pagamento do Bolsa Família - Ed Ferreira/AE
Ed Ferreira/AE
Jorge Hereda deu entrevistas nesta segunda sobre os tropeços no pagamento do Bolsa Família
Entre segunda-feira, dia 20, e sexta-feira, dia 24, a versão oficial dava conta de que a liberação do benefício havia ocorrido só após o início dos tumultos em agências bancárias da Caixa Econômica Federal, responsável por distribuir as verbas. Nesse período, integrantes do governo Dilma classificaram os boatos como uma "ação orquestrada". A ministra da Secretaria Especial de Direitos Humanos, Maria do Rosário, chegou a falar em uma "central de notícias da oposição". Após quatro dias a Caixa divulgou nota confirmando que a liberação havia, sim, sido feita no dia 17.
Nesta segunda-feira, 27, o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, e o presidente da Caixa Econômica Federal, Jorge Hereda, admitiram que sabiam já naquela segunda-feira do dia 20 que o banco havia antecipado a liberação dos recursos. Hereda disse, em uma entrevista concedida após Dilma pedir que ele desse um esclarecimento público, que a primeira versão oficial se tratou de um "erro".
A Caixa nega, porém, que a liberação excepcional de recursos do Bolsa Família na véspera tenha motivado os boatos sobre o fim do benefício e causado a corrida aos caixas eletrônicos. Já a oposição diz que esse pode, sim, ter sido o motivo do pânico.
Questionado sobre o motivo de ter levado quatro dias para confirmar a informação, Hereda disse que ordenou, ainda na segunda-feira, que fosse feito um levantamento completo sobre o ocorrido, que teria levado uma semana para ser concluído. "Eu sou presidente de um banco e não vou a público apenas com parte da informação", afirmou Hereda. "Essa imprecisão só se justifica pelo momento que a gente estava vivendo e eu peço desculpas pelo engano na manifestação". Já o vice-presidente de Governo do banco, José Urbano, disse que não houve demora. "Se três dias é muito tempo, é uma questão de opinião."
Falhas. Segundo a Caixa, desde março atualizações no sistema de beneficiários mostraram que cerca de 692 mil famílias possuíam mais de um cadastro, chamado de número NIS. O banco decidiu eliminar a duplicidade e adotar apenas o número mais antigo para fazer o depósito.
Como o calendário de pagamentos segue a ordem do último número desse cadastro, o banco justificou a antecipação para evitar que algumas famílias tentassem sacar o benefício sem que ele estivesse liberado.
Mas, conforme Hereda, nenhum beneficiário foi avisado sobre essa liberação antecipada.
Segundo a Caixa, os beneficiários somente foram contatados a partir de segunda-feira, 20. Por SMS, 2,588 milhões de celulares, de usuários de 13 Estados, receberam às 20h a seguinte mensagem: "A Caixa informa: o Bolsa Família está sendo pago normalmente, de acordo com o calendário de pagamentos. Não acredite em boatos".
Urbano negou também que a Caixa tenha deixado prosperar o boato de que o fim do Bolsa Família estivesse ligado à oposição. "Jamais iríamos tomar essa iniciativa de saber que houve um problema e deixar que ele continuasse acontecendo."
O vice-presidente do banco disse que o boato ocorreu independentemente das ações da Caixa. "Ele aconteceu por um fator alheio à decisão, e pode ter se valido dessa decisão. A Polícia Federal vai investigar, mas esse não foi o fator motivador", afirmou o dirigente da Caixa.
Dilma ficou preocupada com o impacto dos boatos sobre o fim do Bolsa Família, razão pela qual chamou Hereda nesta segunda para uma reunião pela manhã. Nesse encontro, pediu que o presidente da Caixa desse as explicações públicas.
O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, criador do Bolsa Família, classificou nesta segunda os boatos sobre o fim do benefício como um "ato de vandalismo".

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