USP cobra 15 quadros achados em lixeira

Marceneiro que encontrou obras aceita devolvê-las, mas exige recompensa


Nataly Costa, de O Estado de S.Paulo
SÃO PAULO - O marceneiro Antônio Luiz Góis Passos, de 46 anos, guarda até hoje a cópia de uma reportagem do Estado da qual foi protagonista há dois anos. Provavelmente vai guardar esta também, mas, agora, ele aparece aqui meio que a contragosto. Em 2011, ele encontrou 15 quadros no lixo da Faculdade de Ciências Farmacêuticas da Universidade de São Paulo (USP), onde trabalha há 17 anos. Agora, a instituição quer as obras de volta. Mas, para devolvê-las, Passos exige recompensa.
Na época, o funcionário da USP perguntou se as obras eram realmente lixo. Guardou os quadros na universidade por uns meses. Perguntou de novo se eram lixo mesmo. Enfim, decidiu levar o material para a sala de casa em Carapicuíba, na Grande São Paulo.
Passos ficou com a parede enfeitada, até que no mês passado a USP abriu sindicância e pediu todos os quadros. As obras não têm grande valor financeiro e a maioria é reprodução, mas tem Ensaio de Ballet, de Edgar Degas (1834-1917), uma ilustração do cartunista paulistano Belmonte (1896-1947), além de obras dos franceses Maurice Utrillo e Maurice de Vlaminck.
Quando Passos resgatou os quadros do lixo, alguns em mau estado de conservação, ele nem achou que aquilo valesse dinheiro. Depois passou a achar, quis vender na feira de Embu das Artes, e desistiu. Gosta mesmo é de mostrar os quadros na parede, se gabando de ter a cópia 83 de cem de qualquer coisa, porque "significa que são apenas cem no mundo".
Dos 15, só um dos quadros, o de Maurice Utrillo, foi analisado por uma especialista. A professora do Departamento de Química da USP Dalva Lúcia de Faria constatou, por meio de uma técnica que investiga a pigmentação, que o quadro é a reprodução da aquarela original, feito em Paris nos anos 1950.
"Mesmo sendo reprodução, as obras têm algum valor", diz Dalva. "O problema é que os quadros são da época em que o curso de Farmácia era com o de Odontologia. Quando separaram, e com a reforma da biblioteca, muita coisa se perdeu e foi para o lixo mesmo."
Cobrança. Dalva não entende por que a USP agora, dois anos depois, faz questão de ter os quadros de volta. "Quando o seu Antônio pegou do lixo, foi porque achou bonito. Ele é supersimples e teve o senso estético despertado de uma maneira que ninguém ali teve."
A USP informou que "aguarda a devolução dos quadros" e não comentou se vai ou não acionar o funcionário judicialmente. Enquanto isso, Passos se sente mal com a situação. "Não acho muito justo, não. O pessoal joga as coisas fora e depois que repercute na imprensa..." Mesmo apegado às obras, ele topa devolver, mas não de graça. "Quero pelo menos uma gratificação por ter salvado uma coisa importante do lixo."

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