O caos nosso de todos os dias

Motoristas e pedestres dividem a culpa pelas infrações e irregularidades cometidas nas vias da cidade

Fernando Guimarães
fernando.guimarães@jcruzeiro.com.br

A pressa, a desatenção, a desinformação e a falta de opção foram as desculpas dadas por motoristas e pedestres que dividem todos os dias espaços cada vez menores no caótico trânsito de Sorocaba. Por cerca de uma hora, a equipe de reportagem percorreu ruas da área central da cidade para verificar o comportamento das pessoas. Não é raro observar uma série de irregularidades e infrações praticadas por condutores e pedestres; porém, não somente na região central. Ao longo do percurso feito pela reportagem, é fácil notar uma variedade de infrações, como usar o celular enquanto dirige; motociclista circulando com apenas uma mão no guidão e com a viseira levantada; motoristas que acessam vias sem sinalizar a intenção; paradas sobre faixa de pedestres; pedestres que querem poupar tempo e cortam caminho para não utilizar a faixa de segurança, entre outras. 

De acordo com a Urbes - Trânsito e Transportes, que promoveu ações da Semana Nacional de Trânsito -- celebrada de 18 a 25 de setembro -- as infrações mais comuns são excesso de velocidade, avanços no sinal vermelho, paradas sobre a faixa de pedestres e estacionamento em vagas exclusivas para deficientes e idosos; e quando não há vagas, vale até parar sobre as popularmente chamadas faixas zebradas, cuja finalidade é canalizar os fluxos de tráfego, seja para separá-los ou para impor a redução de velocidade àqueles que acessarão uma avenida, por exemplo. Na rua Paula Souza, mães e pais de alunos do Colégio Santa Escolástica dizem não ter opção para parar na rua enquanto aguardam os filhos saírem da escola. "Todos os dias é assim. Essa rotatividade. Quando não dá para parar ou vejo um policial se aproximando ligo o carro e dou uma volta. Quando não tem vaga, tenho de parar no meio da rua para a minha filha entrar no carro", declara uma mãe que não quis se identificar por receio de sofrer multa por meio do jornal. Outra mãe, que havia parado o carro em um ponto regulamentado, sugeriu que a solução para resolver a questão seria o colégio colocar um estacionamento dentro do estabelecimento. Disse que todos os dias é o mesmo transtorno, o desafio de encontrar uma vaga certa para esperar os filhos.
Terra sem lei?
Próximo à estação rodoviária, os abusos também são uma constante. Pedestres atravessam as avenidas fora da faixa, em esquinas ou em curvas, expondo-se a riscos de atropelamentos. Motoristas e motociclistas param sobre a faixa para aguardar a abertura do semáforo e nem todos dão seta para indicar intenção de direção.
Pedestres ouvidos afirmam que há pontos nas avenidas em que fica difícil usar a faixa porque tem de andar muito. Um ponto de ônibus urbano, situado na avenida Juscelino Kubitschek de Oliveira, em frente à rodoviária e do outro lado da pista, por exemplo, está, segundo os usuários, bem localizado, mas afirmam que precisa de uma faixa de pedestre para que as pessoas não tenham de caminhar até o cruzamento da avenida Juscelino com a avenida Comendador Pereira Inácio para atravessar com segurança. "Andar pelas ruas já é difícil, usar as faixas de pedestres é quase que impraticável porque o motorista acha que é ele que tem a preferência e a falta de mais faixas de segurança em pontos específicos dificultam muito a vida do pedestre. E todos somos pedestres antes de sermos condutores, não é verdade?!", questiona uma senhora que atravessou a Juscelino fora da faixa.

Em diversos cruzamentos, é possível observar muitos motoristas e motociclistas pararem sobre as faixas de pedestre. Na praça da Bandeira, uma caminhonete parou sobre a faixa para aguardar a abertura do sinal. Apesar de toda a orientação, quem de nós, vez ou outra, não comete uma infração de trânsito? Quantos de nós já não atravessou a pista fora da faixa, dando aquela corridinha clássica? Quem nunca fez uma conversão sem dar seta? Uma coisa é fato: para evitar que os erros continuem, os equívocos também, como disseram alguns pedestres, é necessário campanhas massivas para modificar o comportamento das pessoas no trânsito. Elas resolveram, por exemplo, nos casos do uso do cinto de segurança e do capacete por motociclistas.

Legislação é sistematicamente desobedecida

Durante o percurso pelas ruas da cidade, a fim de verificar o comportamento das pessoas no trânsito, pelo menos três situações chamaram a atenção: a de um guarda civil municipal que atravessou a avenida Engenheiro Carlos Reinaldo Mendes, próximo à rotatória do Fórum, sem usar a faixa de pedestre; a de uma viatura da Agência de Transporte do Estado de São Paulo (Artesp) estacionada em local permitido, porém, sem cumprir as orientações expressas pela placa de sinalização; e a de uma mulher que estacionou o carro na frente de uma guia rebaixada para cadeirantes e, ainda, na contramão.

Exceto o guarda municipal que optou por atravessar fora da faixa de pedestre, a Artesp e a mulher que infringiu mais de um artigo do Código de Trânsito Brasileiro (CTB) conversaram com a reportagem. O funcionário da Agência, que dirigia uma viatura VW Gol, estacionou em frente à Rodoviária, na avenida Juscelino Kubitschek de Oliveira, em um trecho onde há uma placa regulamentando a manobra. É permitido estacionar, mas a vaga é rápida, de 15 minutos, e quem estaciona ali é obrigado a ligar o pisca-alerta. O motorista da viatura não cumpriu nenhuma das determinações. Contatada pela reportagem, a Agência afirmou por meio de nota que todos os motoristas a serviço da Artesp são orientados a seguir as normas de trânsito vigentes. "No caso específico relatado pela reportagem, o setor responsável irá abrir um procedimento para averiguar o que ocorreu, identificando o condutor do veículo e solicitando explicações. Possíveis sanções ao infrator serão definidas após a apuração do ocorrido", descreve a nota.

No outro caso, a motorista de um Renault Logan protagonizou uma cena arriscada: desceu a rua Fagundes Varela, travessa da avenida Juscelino, para pegar o marido que havia passado por exame em uma clínica situada naquele endereço. Não haveria problema, se ela tivesse executado todas as manobras de maneira regular. A mulher, que conversou com a reportagem, mas não quis se identificar, fez exatamente o contrário e acabou infringindo mais de um artigo do CTB em um intervalo de tempo de 15 minutos. Entrou na rua pela contramão, estacionou em frente à clínica na contramão, interceptou o acesso de cadeirantes à calçada, deu marcha à ré na contramão ao perceber a reportagem e, por fim, estacionou na avenida próximo à esquina: outra infração de trânsito. Ela tentou explicar-se dizendo que o marido sairia anestesiado e grogue da clínica e que uma funcionária teria afirmado que a parada para o embarque seria rápida. O fato aconteceu logo após o almoço, na quinta-feira, data em que se celebrava o Dia Nacional do Trânsito.

Ouvido pela reportagem, o advogado sorocabano Fábio Cenci afirma que todos os órgãos, como a Artesp, inclusive polícias Militar e Civil e Guarda Civil Municipal, por exemplo, estão sujeitas às normas de trânsito e devem respeitá-las, até mesmo como forma de exemplo aos demais cidadãos. "Os policiais devem usar cinto de segurança, abaixar a viseira dos capacetes e fazer com que a lei seja cumprida. Da mesma forma, deve a Artesp seguir as regras de trânsito e toda a legislação brasileira", comenta.

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