Depois de um dos finais de semana mais tensos do segundo mandato da presidenta Dilma, o vice-presidente Michel Temer trouxe sua habitual calma para tratar a crise atual, turbinada pelo seu colega de legenda, Eduardo Cunha. “Esta é uma crisezinha política, não se trata de instabilidade institucional”, afirmou Temer, em uma evento para acadêmicos e empresários em Nova York. Estava apresentando o país como um celeiro de oportunidades para aquele público.
Não era somente uma frase de efeito para vender o Brasil. A mesma posição apaziguadora havia sido tomada na sexta-feira passada, quando o presidente da Câmara anunciou seu rompimento com o Governo. Segundos depois de Cunha reunir os jornalistas para dar a notícia, o telefone de Temer não parava de tocar. Em sua casa, no bairro de Alto de Pinheiros, em São Paulo, o vice-presidente procurava acalmar seus interlocutores dizendo que a atitude de seu colega de partido não se tratava de uma posição partidária, mas de uma opção individual do presidente da Câmara. Ele não saiu de casa durante o dia todo. Tampouco fez alguma declaração oficial, deixando para o partido formalizar sua posição por meio de uma nota à imprensa. Apenas validou o conteúdo antes de partir para os Estados Unidos com a mulher, Marcela, e o filho, Michelzinho, onde deve permanecer até o final da semana.
A discrição e a extrema ponderação sempre foram um traço que se destacou na identidade do vice-presidente. Muitas vezes essas características foram interpretadas como fraqueza ou falta de ambição pela sua pouca afeição aos holofotes. Mas, na política o mistério vale ouro. E num momento em que sobra crise e falta liderança, o equilíbrio de Temer para lidar com o caos tem sido uma virtude que se sobressai. Transformou-se no fiador da estabilidade do Governo Dilma e do Brasil.
Estão todos atentos aos movimentos do líder do PMDB que precisa aplacar a ira de Cunha, defender o papel de Dilma, e ao mesmo tempo pavimentar o caminho do seu partido para as eleições presidenciais de 2018. “Veremos se ele tem estofo para ser um novo Ulysses Guimarães”, disse o cientista político Rudá Ricci, citando o ex-presidente do PMDB que teve papel fundamental na transição do governo militar para a democracia nos anos 80.
Temer tem demonstrado lealdade à presidenta num momento em que até mesmo Lula, assim como o PT, se distanciam dela. “Eu não vou cair”, disse Dilma no início deste mês, em entrevista ao jornal Folha de S. Paulo. Dois dias depois, Temer reiterou: “Ninguém precisa segurar [a presidenta no poder] porque a presidenta Dilma vai continuar até o final [de seu mandato] com muita tranquilidade”, afirmou para jornalistas. “Ela tem uma capacidade extraordinária de trabalho, conhece o Brasil como poucos. O PMDB é um partido aliado e, naturalmente, está colaborando com a presidenta Dilma e com o país”.
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A outra oferece uma pista do que Temer valoriza. No final do ano passado, ele recomendou em sua conta no Instagram a leitura do livro O Leão de Toscana, que conta a história do campeão de ciclismo Gino Bartali, que durante a Segunda Guerra se envolveu em um movimento secreto para ajudar famílias judias quando a Itália foi ocupada por tropas alemãs. Ele usava sua bicicleta para levar documentos falsos aos refugiados. Desde abril, quando o vice-presidente recebeu de Dilma o ofício de ser o articulador político do Governo, ele não para de pedalar para manter um pouco de equilíbrio na segunda gestão da petista e no Brasil como um todo. (colaborou Carla Jiménez)
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