Bernardo Mello Franco: Erundina deu uma lição ao STF, que há 135 dias dorme sobre processo de Cunha


29 de abril de 2016 às 11h13

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A lição de Erundina ao STF
29/04/2016 02h00
BRASÍLIA – Em dezembro do ano passado, o Supremo Tribunal Federal recebeu um pedido para afastar o deputado Eduardo Cunha da presidência da Câmara.
O procurador-geral da República, Rodrigo Janot, sustentou que a medida era necessária e urgente para proteger a Lava Jato e a “dignidade do Parlamento”.
Enquanto fosse mantido no cargo, escreveu Janot, o peemedebista continuaria a usá-lo “em benefício próprio e de seu grupo criminoso, com a finalidade de obstruir e tumultuar as investigações”.
Em 183 páginas, o procurador acusou o deputado de “destruir provas, pressionar testemunhas e intimidar vítimas”.
“É imperioso que a Suprema Corte do Brasil garanta o regular funcionamento das instituições, o que somente será possível se (…) adotada a medida de afastamento do deputado Eduardo Cunha”, afirmou Janot.
Apesar do pedido de urgência, os juízes do STF saíram de férias sem analisar o documento.
Voltaram em fevereiro, mas a ação continuou na gaveta, onde adormece há 135 dias.
Neste período, alguns ministros da corte foram à TV dizer que as instituições estão funcionando.
Nunca explicaram por que o pedido para afastar Cunha ainda não foi julgado.
Enquanto o Supremo lavou as mãos, o deputado recuperou força política ao chefiar o processo de impeachment contra Dilma Rousseff.
Conseguiu uma trégua da oposição e encorajou aliados a falarem abertamente numa “anistia” para salvá-lo.
Na quarta-feira, Cunha retomou uma prática antiga.
Derrotado num debate que opunha a bancada evangélica à minoria feminina na Câmara, parou a sessão e forçou o plenário a votar de novo até reverter o resultado, em prejuízo das mulheres.
A deputada Luiza Erundina, do PSOL, subiu à presidência para protestar (veja abaixo).
O peemedebista se levantou, e ela se sentou por alguns minutos na cadeira que ele não deveria mais ocupar.
Aos 81 anos, a paraibana deu uma lição aos ministros do Supremo que continuam de braços cruzados.
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Cunha ignora Plenário e insiste em votação até ganhar
Presidente da Câmara ignora adiamento de análise de criação de novas comissões, causa rebelião entre deputadas, interrompe sessão e convence líderes a aprovarem a proposta que, segundo as parlamentares, tem como objetivo favorecer aliados do peemedebista
Gritos de “golpista” e “fora, Cunha”, ocupação da Mesa Diretora por deputadas, sessão suspensa, troca de acusações. O presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), voltou a causar polêmica ao insistir em uma votação, na qual saíra derrotado inicialmente, até ver a proposta que apoiava ser aprovada.
Em sessão tumultuada, que só terminou na madrugada desta quinta-feira (28), os deputados aprovaram, por 221 votos a 167 e uma abstenção, a criação de duas novas comissões permanentes: a de Defesa dos Direitos da Mulher e a de Defesa dos Direitos da Pessoa Idosa.
A confusão começou por volta das 20h, após Cunha declarar rejeitado o requerimento de retirada de pauta do projeto que criava os novos colegiados, contrariando a maioria do plenário.
Liderados pela bancada feminina, diversos parlamentares acusaram o presidente da Câmara de manobrar e promover um “golpe” em plenário.
Elas protestaram contra a exclusão de temas considerados prioritários para as mulheres, como direitos reprodutivos e aborto, do âmbito da nova comissão.
Cunha ignorou o apelo das deputadas, que tomaram a Mesa Diretora e as duas tribunas diametralmente opostas do plenário. Dessa maneira, impediram que o deputado João Campos (PRB-GO), relator do projeto e aliado de Cunha, pudesse usar um dos microfones e dar continuidade à sessão – o peemedebista se mantinha decidido a manter aprovação da matéria. Campos é um dos coordenadores da bancada evangélica.
De dedo em riste, a deputada Moema Gramacho (PT-BA) foi até a cadeira do presidente da Câmara para cobrar explicações.
Diante da confusão, Cunha suspendeu a sessão. A deputada Luiza Erundina (Psol-SP) se sentou na cadeira dele enquanto outras parlamentares se revezavam à mesa. “Quem sabe das necessidades e dos interesses das mulheres somos nós mulheres. Não aceitamos que nenhum homem nos substitua para dizer quais são os nossos direitos”, havia discurso minutos antes Erundina.
Veja o momento em que as mulheres “destituíram” Cunha da Mesa:
Esta não é a primeira vez que o presidente da Câmara é acusado de ignorar um resultado do plenário que contraria sua orientação e insistir na votação até que a decisão lhe agrade. O peemedebista foi acusado no ano passado de manobrar, por exemplo, na análise da proposta que reduz de 18 para 16 anos a maioridade penal.
Durante a interrupção da sessão dessa quarta-feira, Cunha se reuniu com líderes partidários e alegou que diversos partidos perderiam cargos se as comissões não fossem criadas. O risco de perder espaço político fez lideranças que resistiam à aprovação da proposta mudar sua orientação, o que garantiu a aprovação do projeto de resolução já na madrugada.
As discussões, porém, prosseguiram em plenário. Em seu parecer, o relator João Campos incluiu o termo “nascituro” entre as atribuições da Comissão de Seguridade, contrariando a posição da maioria das parlamentares. Na prática, discussões sobre aborto, por exemplo, não serão tratadas na Comissão da Mulher.
“Estamos criando um meio instrumento, estamos fazendo de conta que estamos debatendo a questão da mulher e rompendo um acordo. Estamos mexendo com uma questão da seguridade que em nenhum momento entrou nessa discussão”, protestou a deputada Jandira Feghali (PCdoB-RJ).
Na avaliação da deputada, em vez de ampliar, o texto retira das competências da Comissão da Mulher a possibilidade de discussão de pontos fundamentais. “Ele [o relator] excluiu do escopo da comissão assuntos fundamentais da mulher, os direitos sexuais e reprodutivos estão excluídos, além de enfraquecer outras estruturas da Câmara voltadas para debater os direitos de mulheres, como a Secretaria da Mulher e a Procuradoria da Mulher. É um retrocesso”, disse.
Moema Gramacho acusou Cunha de quebrar um acordo sobre a abrangência da nova comissão e de ignorar o posicionamento das deputadas para favorecer seus aliados políticos. “Não somos contrárias à criação das comissões da mulher ou do idoso, mas sim a forma como esta comissão foi trazida aqui, somente para contemplar os aliados com cargos nas novas estruturas”, disse.
Para a deputada Erika Kokay (PT-DF), a nova comissão não enfrentará as discussões que mais afetam as mulheres. “É uma comissão executiva: para incentivar, para receber denúncia, para fiscalizar, para oferecer prêmios, mas não para discutir o mérito das matérias no que diz respeito às mulheres. Queremos discutir a violência contra a mulher, a desigualdade salarial que atinge as mulheres e tantas outras questões”, criticou.
João Campos rebateu as críticas. “Não concebo a ideia de que a política relacionada à remuneração das mulheres seja discutida fora do contexto da política dos trabalhadores em conjunto na Comissão de Trabalho e Serviço Público”, disse o relator.
O Plenário rejeitou, por 275 votos a 107, destaque do PT que pretendia excluir a nova atribuição dada à Comissão de Seguridade Social e Família para análise de temas relacionados ao nascituro

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