Consultor Jurídico: Moro mandou prender Palocci por falta de provas; Lula, o “comandante máximo”, vetou MP que beneficiava Odebrecht

Viomundo

27 de setembro de 2016 às 02h57


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Da Redação
O powerpoint do procurador Deltan Dallagnol e os argumentos para prender os ex-ministros Guido Mantega e Antonio Palocci faltando apenas alguns dias para as eleições municipais causaram uma tremenda confusão na lógica interna da Operação Lava Jato.
De acordo com o chefe da Força Tarefa de Curitiba, o ex-presidente Lula era o “comandante máximo” do esquema através do qual o Partido dos Trabalhadores trocou contratos com a Petrobras — e outros benefícios — por concessão de vantagens pessoais ou contribuições eleitorais.
Porém, na acusação a Palocci, os procuradores argumentam que ele prometeu “compensar” a Odebrecht depois que o ex-presidente Lula vetou medida provisória de interesse da empreiteira. Trata-se da MP 460, de 2009, que daria regime especial de tributação para as incorporadoras. É um dos ramos nos quais atua a Odebrecht. Palocci, àquela altura, era deputado federal e lobista.
A convicção dos acusadores foi formada a partir de uma mensagem escrita por Marcelo Odebrechet, que diz:
“Tudo que é bom, é difícil. Tudo que é fácil, não é para nós. Acho que o ‘muito pequeno’ obstáculo de hoje abre uma avenida de oportunidade para sairmos ainda melhor do que se tivessemos ganho. Hoje estavámos ‘carregando’ um mundo de gente, agora com a dívida (ainda que moral, e de contumazes mal pagadores) que nossos ‘amigos’ tem conosco, podemos tentar emplacar ganhos maiores só para nós. Italiano acabou de me ligar. Disse que GM (Guido Mantega) manipulou a info para o PR (presidente). Vai estar com PR na 2ª ou durante o final de semana. Combinamos de nos encontrar amanhã as 15hs. Ele mesmo pediu além dos argumentos para a sanção/veto parcial, que levassemos alternativas para nos compensar. Sejamos criativos!”
Os procuradores não apresentaram provas factuais de que tenha havido alguma compensação.
Se vale a interpretação literal das palavras do empreiteiro, Guido Mantega e Lula atuaram contraos interesses da Odebrechet, o que não é compatível com a ideia de Lula, o “general” da “propinocracia”, preocupado acima de tudo em extorquir empreiteiras para se perpetuar no poder.
Além disso, Marcelo supostamente se refere aos petistas como “contumazes mal pagadores” e amigos entre aspas, o que contradiz a ideia de que do outro lado havia uma “quadrilha” comandada por Lula sempre disposta a atender as demandas da Odebrecht. Além disso, que “quadrilha” é esta em que um dos subordinados de Lula, Mantega, manipulou informações para prejudicar parceiros?
No que batizamos de “manual da guerrilha” de Sérgio Moro — uma análise que ele fez da Operação Mãos Limpas, da Itália –, o juiz de Curitiba destacou, mas sem criticar, o uso de boatos, da mídia e de prisões antes da condenação definitiva — como as que determinou agora — como forma de combater a corrupção.
Para ele, é essencial “deslegitimar” o sistema:
A deslegitimação do sistema foi ainda agravada com o início das prisões e a divulgação de casos de corrupção. A deslegitimação, ao mesmo tempo em que tornava possível a ação judicial, era por ela alimentada. A deslegitimação da classe política propiciou um ímpeto às investigações de corrupção e os resultados desta fortaleceram o processo de deslegitimação.
Sobre a publicidade — gerada, entre outros motivos, pelas prisões –, Moro escreveu, referindo-se à Itália:
A publicidade conferida às investigações teve o efeito salutar de alertar os investigados em potencial sobre o aumento da massa de informações nas mãos dos magistrados, favorecendo novas confissões e colaborações. Mais importante: garantiu o apoio da opinião pública às ações judiciais, impedindo que as figuras públicas investigadas obstruíssem o trabalho dos magistrados, o que, como visto, foi de fato tentado. Há sempre o risco de lesão indevida à honra do investigado ou acusado. Cabe aqui, porém, o cuidado na desvelação de fatos relativos à investigação, e não a proibição abstrata de divulgação, pois a publicidade tem objetivos legítimos e que não podem ser alcançados por outros meios. As prisões, confissões e a publicidade conferida às informações obtidas geraram um círculo virtuoso, consistindo na única explicação possível para a magnitude dos resultados obtidos pela operação mani pulite.
Moro já violou a lei ao menos uma vez na “desvelação” de fatos, ao divulgar um grampo telefônico entre a presidente Dilma Rousseff e Lula.
Os advogados de Lula dizem que também o fez ao autorizar grampo em escritório de advogados e a condução coercitiva do ex-presidente.
A prisão temporária de dois importantes ex-ministros do PT em período eleitoral certamente contribui para “deslegitimar” ainda mais o já combalido Partido dos Trabalhadores.
A de Guido Mantega, na quinta-feira 22, foi fortemente contestada.
A acusação contra ele é de ter pedido R$ 5 milhões em doações ao PT do empresário Eike Batista.
Porém, em seu depoimento, Eike nunca relacionou a doação a algum contrato de sua empresa com a Petrobras — contrariando o texto da decisão de Moro, que mandou prender Mantega alegando que “o pagamento estaria vinculado ao esquema criminoso que vitimou a Petrobrás e a propinas também pagas a agentes da Petrobrás no âmbito do contrato da Petrobrás com o Consórcio Integra”.
A claríssima contradição entre o dito por Eike e o escrito por Moro foi apontada pelo jornalista Fernando Molica.
Moro pediu o bloqueio de “até R$ 10 milhões” das contas de Mantega e dos que foram presos com ele, mas na do ex-ministro apenas R$ 4.447,55 foram encontrados.
Anunciadas com destaque na TV, as estimativas de Moro para a propina supostamente paga são acima de tudo um truque cenográfico.
Tem o efeito espetaculoso de oferecer à mídia números grandiosos: no caso de Palocci, Moro mandou bloquear “até R$ 128 milhões” do ex-ministro e dos que foram presos junto com ele. É a estimativa do dinheiro que eles teriam de ter recebido da Odebrecht.
No caso de Lula, o fato de que o triplex do Guarujá não está em nome do ex-presidente foi mencionado por um dos procuradores como “prova” de que existiu ocultação de patrimônio.
No caso de Palocci, foi a inexistência da comprovação física dos pagamentos e da conta ou contas onde o dinheiro teria sido depositado que fez Moro mandar prender o ex-ministro.
Ou, como resumiu o Consultor Jurídico, o ex-ministro foi preso por falta de provas:
CAMINHO DO DINHEIRO
Falta de provas justifica prisão temporária de Palocci, afirma Sergio Moro
O ex-deputado e ex-ministro da Fazenda e da Casa Civil Antonio Palocci é acusado de receber propina para trabalhar pela Odebrecht dentro do governo e no Congresso Nacional. Mas como não foram encontradas provas do recebimento dessas quantias, Palocci deve ficar preso, “enquanto não houver tal identificação”.
Essa é a motivação usada pelo juiz Sergio Fernando Moro, titular da 13ª Vara Federal Criminal de Curitiba, onde corre a maioria dos processos da “lava jato”, para mandar prender o ex-ministro.
De acordo com o juiz, as investigações da operação “lava jato” apresentaram provas de que R$ 128 milhões foram pagos a Palocci para favorecer a construtora no governo. Entretanto, ainda não há provas do recebimento desse dinheiro, e nem a conta em que essa quantia foi depositada.
Para Moro, isso é indício de que Palocci usa de um “modus operandi” já visto em outras ocasiões, de usar “contas secretas no exterior ainda não identificadas ou bloqueadas”. E, enquanto essas contas não forem encontradas, “há um risco de dissipação do produto do crime”.
“Enquanto não afastado o risco de dissipação do produto do crime, presente igualmente um risco maior de fuga ao exterior, uma vez que os investigados poderiam se valer de recursos ilícitos ali mantidos para facilitar fuga e refúgio no exterior”, escreveu Moro.
Segundo o juiz, ainda há saldo de R$ 80 milhões a ser pago, o que explicitaria a necessidade da prisão. Ele afirma que deixar Palocci solto traria “risco à ordem pública”, já que “o contexto não é de envolvimento episódico em crimes de corrupção e de lavagem de dinheiro, mas do recebimento sistemático de propinas, remontando a relação entre o Grupo Odebrecht e Antônio Palocci Filho a pelo menos 2006 e estendendo-se por anos”.
“Por outro lado, não se pode olvidar a gravidade em concreto dos crimes em apuração”, completou. “Viável, portanto, em principio, a decretação da prisão preventiva requerida.”
A ConJur tentou contato com o advogado de Antonio Palocci, o criminalista José Roberto Batochio, mas não teve resposta até a publicação desta reportagem.
Medida menos drástica
O Ministério Público Federal em Curitiba havia pedido a prisão preventiva de Palocci, mas Moro entendeu ser “medida menos drástica” a prisão temporária, que tem prazo de cinco dias. Depois disso, pode ser renovada, transformada em prisão preventiva, sem prazo para terminar, ou em ordem de soltura.
De acordo com o magistrado, todas as provas contra o ex-ministro da Fazenda do primeiro mandato de Lula surgiram em “cognição sumária”, e explicações podem aparecer depois das diligências de busca e apreensão e depoimentos dos envolvidos. Além de Palocci, foi preso também nesta segunda Branislav Kontic, que foi chefe de gabinete do ex-ministro e seu assessor durante a campanha de 2006 para a Câmara dos Deputados.
Eles são acusados de corrupção e lavagem de dinheiro. De acordo com o que os integrantes da “lava jato” levaram à 13ª Vara, a Odebrecht depositava dinheiro para que Palocci direcionasse a política econômica do governo federal para favorecê-la. As provas são planilhas das quais constam o apelido “italiano”, que a PF acredita ser uma referência ao ex-ministro.
Política fiscal
Palocci foi ministro da Fazenda durante o primeiro mandato de Lula, que durou de janeiro 2003 a janeiro de 2006. Foi ele o responsável pelo desenho econômico das políticas de transferência de renda, resumidas no Bolsa Família, e de moradia, como o Minha Casa Minha vida – esta ganhou destaque no primeiro mandato de Dilma Rousseff, quando Palocci ocupou a Casa Civil.
De acordo com os investigadores, quando estava no governo Lula, Palocci negociou propina com a Odebrecht para interferir em licitações de compra de navios-sonda para exploração de campos do pré-sal. Depois, em 2009, como deputado, ele passou a negociar a inclusão de dispositivos na Medida Provisória 460/2009 que beneficiassem a empreiteira.
A acusação diz que Palocci negociou com o governo a extensão do chamado crédito prêmio de IPI até dezembro de 2002. No caso da MP, o pedido da Odebrecht era para que a União pudesse fazer acordos com empresas em litígio com a Fazenda Nacional por causa do crédito prêmio, tanto na esfera judicial quanto administrativa.
Mas o Supremo Tribunal Federal já decidiu que o crédito prêmio concedido a exportadoras depois de outubro de 1990 é inconstitucional por contrariar o Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, que tratava do assunto como um incentivo setorial que precisaria de autorização legal.
E justamente por isso, o crédito não foi incluído no texto da MP 460, que tratou basicamente de benefícios fiscais às empresas que constituíssem imóveis cadastrados no Minha Casa Minha Vida. O crédito prêmio de IPI é um desconto concedido a exportadoras ou fabricantes de produtos manufaturados “como ressarcimento de tributos pagos indevidamente”, como diz o Decreto-Lei 491, de 1969.
Depois disso, segundo o MPF, Palocci tentou incluir a previsão na conversão da MP em lei. E novamente não conseguiu. O Congresso chegou a aprovar a disposição, mas ela foi vetada pela Presidência da República. Seguindo orientação dos ministérios do Planejamento e da Justiça, a então presidente Dilma Rousseff anotou que o projeto de conversão traria benefícios para empresas em litígio em detrimento das que pagaram seus impostos sem questionar. Além de confrontar a jurisprudência do Supremo.
Segundo e-mails entregues pelo MPF à 13ª Vara de Curitiba, Marcelo Odebrecht reclamou de interferência de Guido Mantega junto às negociações. Por isso, em compensação, Palocci teria interferido para que o BNDES concedesse empréstimos à empreiteira para obras em Angola.
PS do Viomundo: E a sigla JD encontrada em documentos apreendidos anteriormente, que a Lava Jato dizia tratar-se definitivamente de José Dirceu, agora é Juscelino Antonio Dourado, ex-chefe de gabinete de Palocci.
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