A Folha e os cotistas: desempenho igual, no mérito e nas deficiências

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A Folha, hoje, publica extensa matéria em que foi averiguar o desempenho dos “cotistas” nas universidades públicas.
A rigor, a reportagem se justifica, porque ainda prevalece em muitos a ideia de que as cotas, sociais ou étnicas, são uma espécie de “caridade” que prejudica aqueles que, “por mérito”, conquistaram ou deixaram de conquistas as vagas.
Os números, além de mostrarem, como no gráfico, que o acesso à universidade vai, lentamente, se aproximando da mesma relação entre ensino público e privado, caminhando para o fim do “problema” mais mencionado quando se fala do ingresso na universidades federais: o de que a “maioria” dos que entram nelas ter alto po9der aquisitivo, vindo do ensino privado.
Provam também que méritos tanto ou mais o têm os que superam as deficiências de sua formação escolar – seja pelo pouco investimento no ensino público, seja pela falta de um ambiente familiar que forneça o suporte à educação.  A melhoria do desempenho durante o curso é evidenciada pelo fato de que qualquer diferença que remanesça ao final é imensamente inferior àquela que se registrava no ingresso da universidade.
Embora a ênfase seja no fato de que, na maioria dos cursos, foi igual  o desempenho dos que ingressaram na universidade com ou sem o sistema de cotas – e só até ali podem ser chamados de cotistas, e não depois, como fazem, caracterizando uma “marca” permanente, que os obrigue a serem sempre “merecedores” do “privilégio” ou “inferiores” que a ele não fizeram jus – sobra um “mas”.
Só lá no final do texto é que se registra o obvio: a dificuldade de desempenho nos cursos e cadeiras que envolvem física e matemática não é exclusiva dos que entraram pelo sistema de cotas.
“Especialmente os primeiros três semestres são puxados para qualquer aluno, porque exige muita matemática”, diz o presidente da Associação Brasileira de Educação em Engenharia, Vanderli Fava de Oliveira. “Para o cotista é ainda pior, porque ele chega com mais defasagem.”
É um problema crônico de nosso ensino – e não só o público – que sempre criou esta divisão absurda entre “humanas” e “exatas”, sem tratar o conhecimento como um todo. Vivi isso na passagem do ensino médio para a universidade, embora do lado oposto: fui para o jornalismo, mas meus colegas de Escola Técnica (pública e ótima) foram para o curso de Engenharia e foram quase os únicos a terem bom desempenho nas cadeiras de Cálculo, um “terror” para os que tinham recebido um ensino médio deficiente nisso.
Infelizmente, a atribuição de “valor de mercado” ao conhecimento, que leva a esta absurda separação de áreas gera essa anomalia, que custa caro à Universidade – porque dobra o custo, pela necessidade de suprir a tal “defasagem” – e desestimula o aluno, gerando forte evasão nos primeiros semestres, onde o professor Oliveira, que é da Federal de Juiz de Fora, “bate os 50%, para cotistas e não cotistas”.
O fato objetivo é que, apesar da renitência do pensamento elitista, a democratização do acesso à universidade pública não gera perda de qualidade – cujas razões não outras, materiais e filosóficas – porque a educação é o maior e mais rápido nivelador de competências e oportunidades de uma sociedade.
É por isso que a elite brasileira, que odeia a visão de pobres nos aeroportos, também se mantêm avessa à sua presença na universidade pública e, por isso, despeja neles os recalques de sua própria mediocridade.
Isso quando não lhes despeja, como faz agora,  esquadrões de policiais.
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