Com a arrecadação em queda por causa da crise e uma
folha de pagamento ‘mais cara’, governadores não conseguiram fechar as contas e
acumularam um déficit histórico no fim de 2017, aponta levantamento do
economista Raul Velloso
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Luciana Dyniewicz, O Estado de
S.Paulo
16
Janeiro 2018 | 05h00
Em um período de três
anos, os Estados saíram de um resultado positivo de R$ 16 bilhões em suas
contas para um déficit de R$ 60 bilhões no fim de 2017. Isso significa que os
governadores assumiram seus postos, em 2015, com o caixa no azul e, se não
tomarem medidas drásticas até o fim deste ano, vão entregar um rombo bilionário
para seus sucessores.
O levantamento feito a pedido do Estado pelo
especialista em contas públicas Raul Velloso mostra o resultado de uma equação
que os governos não conseguiram resolver: uma folha de pagamento crescente
associada a uma queda na arrecadação de impostos por causa da crise econômica.
“É o mandato maldito”, diz Velloso. “Diante da pior recessão do País, os
Estados saíram de um resultado positivo para um déficit histórico.”
Rio Grande do Norte enfrentou greve de
policiais militares, civis e agentes penitenciários. Foto: Ricardo
Araújo/Estadão
O Rio Grande do Norte
foi o Estado cuja deterioração fiscal se deu mais rapidamente nesse período. Depois
de ter acumulado um superávit de R$ 4 bilhões entre 2011 e 2014, entrou numa
trajetória negativa até acumular um déficit de R$ 2,8 bilhões de 2015 a outubro
de 2017.
Esse descompasso fiscal pode ser visto nas ruas.
Com salários atrasados, a polícia civil entrou em greve e uma onda de violência
tomou o Estado no fim do ano. Os policiais encerraram a paralisação, mas servidores da saúde continuam em greve (leia
mais abaixo).
Além do Rio Grande do
Norte, os casos de desajuste fiscal que ficaram mais conhecidos foram os do Rio
de Janeiro e de Minas Gerais. Mas outros Estados seguem o mesmo caminho, como
Goiás, Pernambuco e Sergipe. Eles estão entre os mais mal avaliados pelo
Tesouro Nacional sob o ponto de vista de capacidade de pagamentos. “Há uma fila
de Estados prontos para passarem por uma crise aguda (como a do Rio Grande do
Norte)”, diz o economista Leonardo Rolim, consultor de orçamentos da Câmara.
Para o economista
Marcos Lisboa, presidente do Insper, o grande vilão do déficit estadual é o
aumento da folha de pagamento dos Estados, que precisa, a cada ano, arcar com
um número maior de aposentados. “O envelhecimento da população é muito rápido
e, por isso, o aumento dos gastos também.”
De acordo com o
levantamento de Velloso, as despesas e receitas anuais dos Estados empataram em
2014, atingindo R$ 929 bilhões cada uma. Desde então, as receitas recuaram de
forma mais abrupta: atingiram R$ 690 bilhões nos dez primeiros meses de 2017,
enquanto as despesas somaram R$ 715 bilhões.
Do lado das receitas,
além da crise reduzir a arrecadação com impostos, o corte de repasses do
governo federal acentuou a dificuldade dos Estados. “Até 2014, o governo dava
empréstimos que mascaravam a situação”, afirma a economista Ana Carla Abrão
Costa, que foi secretária da Fazenda de Goiás até 2016.
Se, nos últimos anos,
o desajuste fiscal já obrigou a maioria dos Estados a reduzir investimentos,
neste ano, o corte deve ser ainda maior. Isso porque, como é último ano de
mandato, os governadores não podem deixar restos a pagar para os que assumirem
em 2019. Tarefa que, para Velloso, é impossível. “Não tem a menor condição de
eles zerarem esses déficits.”
Já Rolim diz que os
governadores poderão recorrer a manobras, como o cancelamento de restos a
pagar. “É uma espécie de calote. Despesas com obras não concluídas, por
exemplo, não tem problema, mas fornecedores poderão ficar sem receber.”
Para Ana Carla, as
contas vão acabar fechando porque o ano é de eleição. “Como não podem deixar
restos a pagar, os Estados vão buscar recursos extraordinários como nunca”,
afirma.
O superintendente do
Tesouro de Goiás, Oldair da Fonseca, afirmou que o governo trabalha com
austeridade para não deixar restos a pagar para 2019. Ele destacou que o
déficit de 2017 ficará em R$ 900 milhões – em 2015, havia sido o dobro. O
secretário das Finanças do Rio Grande do Norte, Gustavo Nogueira, afirmou que a
raiz do problema é o déficit previdenciário. O governo de Pernambuco disse que
não considera como despesa total as despesa empenhadas (autorizadas), como foi
feito no levantamento, e que fechou o ano com receita para cobrir seus gastos.
O de Sergipe não retornou.
O governo do Rio afirmou que sua situação foi muito
prejudicada pela crise, já que sua economia é dependente da indústria do
petróleo. O de Minas Gerais informou que já recebeu o Estado em situação
delicada e que a folha de pagamento tem deteriorado as contas ainda mais.
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